Entrevista:O Estado inteligente

sábado, janeiro 12, 2008

Miriam Leitão Disputa americana

O economista Tom Trebat, da Universidade de Columbia, acha que a economia americana já pode estar tecnicamente em recessão, vivendo o segundo trimestre de encolhimento; e acredita que Barack Obama tem mais chances de ganhar as primárias democratas. O cientista político Amaury de Souza acha que Hillary Clinton tem mais controle sobre a máquina e lembra que, entre os republicanos, há muita novidade também.

Conversei com Amaury e Tom, esta semana, no programa da Globonews, sobre essa instigante primária americana, vivida com emoção, viradas e diversidade, no meio de uma crise econômica que parece cada vez mais assustadora. Nos últimos dias, vieram mais sinais da armadilha em que está a maior economia do mundo. O presidente do Fed, Ben Bernanke, avisou o que o mercado já esperava: os juros podem cair mais fortemente na reunião de 30 de janeiro. O problema é que, se a inflação pressionar, esse remédio é arriscado.

Enquanto isso, o governo Bush prepara um pacote de bondades fiscais.

— A minha impressão é que a Hillary tem condições melhores, controla mais a máquina partidária, a estrutura sindical, é do establish ment (comando) do partido, por isso tem mais chances de ganhar. O Barack Obama é uma mistura de tudo, completa, mãe branca, pai negro, padrasto com inclinações muçulmanas, avós africanos.

É mestiço, multicultural e pode se apresentar como a possibilidade de união, mas duvido que os americanos estejam preparados para algo assim tão otimista, tão novo — afirma Amaury de Souza.

De Nova York, Tom Trebat discorda: — Obama é o primeiro afro-americano, um fenômeno novo; sendo novidade, ele tem grande chance de sair candidato. Se terá sucesso na eleição de novembro é cedo para dizer.

Tom acha que os quatro pré-candidatos do Partido Democrata são a cara da América atual. Além de Hillary, Obama e John Edwards, havia também Bill Richardson (hispânico, com mãe mexicana), que desistiu. Na opinião de Tom, não haverá uma chapa Obama-Hillary ou viceversa, porque esta não é a tradição da política americana.

Mas Richardson pode entrar como vice do vencedor da primária.

Perguntei a ele se a figura de Obama e tudo o que representa não assustam o eleitor médio americano.

— E ele ainda tem este nome “Obama”, que parece Osama, e Hussein (Barack Hussein Obama). É até engraçado.

Mas ele não está concorrendo como um candidato afro-americano. A comunidade até favorecia mais os Clinton. Obama não faz questão alguma de aparecer como um candidato negro. Alguns o criticam por não lidar com questões raciais. Tem boas chances porque o país mudou. Só o fato de ele ter subido é prova disso — avalia Tom.

— O Tom tem razão: há uma grande mudança nos Estados Unidos e não apenas no lado democrata. No Partido Democrata, estão os candidatos mais interessantes, e os republicanos estão divididos. Mas veja o Rudi Giuliani. Ele é o típico falcão republicano em algumas questões, acha que o fundamentalismo islâmico tem que ser combatido a qualquer preço, mas é a favor do aborto, assunto que não tem eco no eleitor republicano; é a favor dos direitos dos homossexuais e é divorciado duas vezes — comenta Amaury.

Tom lembrou também que John McCain — que ele não vê como vencedor, mas apenas como o “sabor do dia”, por ter vencido em New Hampshire — representa uma grande mudança em relação a Bush: — Esta eleição pode ser resumida na palavra change, mudança. McCain tem posições até progressistas em vários pontos e foi co-autor da única legislação sensata em matéria de imigração.

Amaury de Souza, no entanto, diz que, em matéria de imigração, todos — republicanos e democratas — são antiimigração. Tom discorda, em parte: — Entre os republicanos, são todos antiimigrantes, com exceção de McCain. Entre os democratas, o discurso parece ser um pouco antiimigrante, mas, no fundo, eles não vêem outra solução para os 15 milhões sem documentos a não ser o caminho da legalidade, da obtenção dos direitos. Se os imigrantes votassem, a maioria votaria nos democratas.

Amaury lembrou que esse tema continua sendo intratável nos Estados Unidos: — Até Bush tentou ter uma legislação a respeito. O problema, a meu ver, é que o assunto não está maduro para a população a ponto de alguém tomar uma posição mais forte.

As próximas semanas continuarão animadas. Agora vêm as primárias de Michigan, Nevada, Carolina do Sul, Flórida e de vários outros estados. Mas o dia realmente decisivo é a “superterça”.

No dia 5 de fevereiro, terça-feira, vinte estados escolherão seu candidato simultaneamente.

Tom Trebat acredita que a grande vantagem da virada de Hillary e McCain em New Hampshire foi mostrar que a competição vai continuar.

— O risco era eliminar prematuramente estados de mais peso eleitoral; era chegarmos na “superterça” com as decisões já tomadas — disse ele.

Agora já se sabe que será eletrizante — para usar a palavra de Amaury — até o fim o processo de escolha dos candidatos. O sistema americano tem méritos e defeitos enormes. O grande mérito é uma escolha da candidatura feita de forma pública, em que os pré-candidatos têm que se expor a tudo e correr todos os riscos.

No Brasil, ou são as cartas marcadas das brigas de grupos do PT ou, pior, os conchavos de quatro grãotucanos em um jantar em restaurante fino. O pior momento do sistema deles se viu em 2000, quando o colégio eleitoral derrotou o voto popular.

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