Entrevista:O Estado inteligente

sábado, janeiro 19, 2008

Kassab e Alckmin na briga pela prefeitura

É só o primeiro round

Disputa pela candidatura à prefeitura paulista
antecipa briga de tucanos pela corrida presidencial


Marcelo Carneiro



Já virou uma tradição no PSDB: antes de enfrentar os adversários numa eleição presidencial, os tucanos engalfinham-se primeiro entre si. Em 2002, José Serra e Tasso Jereissati disputaram a candidatura do partido à Presidência num embate tão traumático que produziu feridas jamais cicatrizadas (o senador cearense e o atual governador de São Paulo, vitorioso na contenda, até hoje se detestam cordialmente). Em 2006, Serra e o então governador Geraldo Alckmin protagonizaram nova e cruenta batalha, também na condição de pré-candidatos do partido à Presidência. Dessa vez, a troca de bicadas durou intermináveis dez meses, ao fim dos quais Alckmin saiu vitorioso e o partido, cindido até o nível de seus alicerces. Neste ano, o arranca-plumas tucano não envolve diretamente a Presidência, mas a capital paulista. Os protagonistas da disputa são o prefeito de São Paulo, Gilberto Kassab, do DEM, que quer tentar a reeleição, e Geraldo Alckmin, que almeja deixar o ostracismo no qual se encontra desde a derrota para Lula, em 2006. Mas, embora a disputa mais visível se dê na esfera municipal, o pano de fundo da briga é novamente uma guerra pelo título de candidato do PSDB à sucessão de Lula. Nela, engalfinham-se (até agora com garras de pelúcia) José Serra e Aécio Neves.

Montagem sobre fotos de Clayton Souza/AE, Lailson Santos, Alex Silva/AE

Ao governador de São Paulo interessa a indicação de Kassab, porque ela reforçaria a aliança tucano-democratas que Serra e aliados sabem ser essencial para a campanha de 2010. Na qualidade de pré-candidato à Presidência mais viável até agora dentro do seu partido, Serra não quer humilhar os aliados do DEM rebaixando Kassab de prefeito a secretário de governador – cargo que chegou a ser cogitado para o democrata em troca da desistência de concorrer ao posto. A reeleição de Kassab é fundamental para o DEM. Esmagado nas últimas eleições, o partido perdeu grande parte dos cargos majoritários que detinha e hoje governa apenas uma capital importante, o Rio de Janeiro. Manter um pé bem fincado em São Paulo é vital para que a sigla consiga desassociar-se de uma vez da imagem de partido dos grotões. Já para Aécio Neves, tudo o que dificultar a escalada de Serra na direção da candidatura à Presidência é bem-vindo – e, nesse sentido, nada poderia ser melhor do que um Alckmin no meio do caminho do governador paulista. Isso ajudaria a enfraquecer Serra dentro do PSDB e, quem sabe, inviabilizar sua candidatura ao Planalto. Aécio faz uma boa aposta: a capacidade do ex-governador de São Paulo de atazanar a vida do atual já foi testada.

Na semana passada, uma entrevista dada pelo ex-presidente da República Fernando Henrique Cardoso ao jornal O Estado de S. Paulo movimentou a disputa tucana pelas candidaturas paulista e nacional – com vantagem para os serristas. Além de defender a candidatura de Kassab como forma de reforçar a aliança do PSDB com os democratas, FHC endossou a proposta de lançar Alckmin como candidato da aliança ao governo do estado em 2010 – "o que liberaria Serra para disputar a Presidência", completou o ex-presidente. A fala de FHC apanhou de surpresa Aécio Neves e, segundo consta, não o deixou exatamente feliz.

Germano Luders
Fernando Henrique Cardoso: apoio a Serra surpreendeu Aécio


O quadro desenhado por FHC não visa apenas a enfrentar o PT em São Paulo com uma candidatura única capaz de fazer frente à de Marta Suplicy, mas criar condições para a construção de um cenário inédito na história recente: aquele em que um partido e a agremiação a ele coligada ocupariam, ao mesmo tempo, os três cargos mais importantes do país. Nos sonhos do grão-tucano, o aliado Kassab ficaria na prefeitura de São Paulo, Alckmin iria para o governo do estado e Serra conquistaria a Presidência da República. Ocorre que, até o momento, Alckmin discorda do plano. Para o ex-governador, disputar a prefeitura paulista é fundamental para a sua sobrevivência política imediata. Depois da derrota nas eleições presidenciais de 2006, ele passou cinco meses na Universidade Harvard, nos Estados Unidos, para uma temporada de estudos. Quando voltou, viu seu espaço no PSDB drasticamente reduzido. Seu grupo de aliados – pequeno em número e carente em expressão – encontra-se fora das administrações estadual e municipal em São Paulo. Alckmin está, portanto, sem mandato e sem poder. Por isso, acredita que só voltará a ter relevância se impuser sua candidatura à prefeitura – e, obviamente, ganhar a eleição. Para convencê-lo do contrário, FHC e Jorge Bornhausen, do DEM, deverão encontrá-lo na próxima semana. Ambos esperam que, ao contrário da posição demonstrada em 2006, quando o ex-governador insistiu em manter sua candidatura à Presidência em detrimento da melhor colocação de Serra nas pesquisas, ele desta vez se mostre mais flexível.

Alckmin mantém um escritório político em uma das principais avenidas de São Paulo, mas, oficialmente, as únicas atividades que exerce são as aulas que dá em três universidades paulistas (Universidade Metropolita-na de Santos, Universidade de Santo Amaro e Faculdade Editora Nacional, em São Caetano do Sul) e as sessões de acupuntura que ministra em um ambulatório do Sistema Único de Saúde, duas vezes por semana. Depois de cursar um ano de medicina chinesa no Hospital do Servidor Público Municipal, em São Paulo, o ex-governador arrisca dar algumas espetadas. Num partido como o PSDB, dar espetadas é um talento que se tem revelado bastante útil.

Marta no páreo

André Dusek/AE
A ministra e agora candidata: alguém aí tem um esparadrapo?

Se dependesse dela, Marta Suplicy só seria candidata em 2010 – ao governo do estado de São Paulo ou à sucessão de Lula. Mas a ministra do Turismo foi voto vencido. No PT de São Paulo, aliados fizeram pressão para que a ex-prefeita entrasse no páreo municipal. No Palácio do Planalto, ninguém admite a possibilidade de o partido marcar presença na disputa pelo comando da maior cidade do país com um candidato de baixo potencial eleitoral – e, no momento, Marta se apresenta como o único nome no PT capaz de alcançar dois dígitos nas pesquisas de intenção de voto. Sua situação é de empate técnico no primeiro lugar com Alckmin, na casa dos 25%. Marta só vai anunciar a candidatura depois que o quadro entre os adversários estiver definido. Pela lei eleitoral, ela precisa se desincompatibilizar do cargo de ministra apenas seis meses antes das eleições. No PT, a torcida é para que Alckmin continue endurecendo o jogo dentro do PSDB em favor da candidatura própria. Um eventual racha na aliança tucano-democrata, com o lançamento de um candidato por partido, seria o melhor dos mundos para os petistas. Mais do que administrar a disputa propriamente dita, no entanto, complicado mesmo para Marta será conter seus rompantes verbais. Autora do histórico "relaxa e goza", aplicado na qualidade de conselho às vítimas do caos aéreo, a ministra mandou mais uma na semana passada. Chamou de "epidemia de fofocas" a proliferação de casos de febre amarela (leia A ameaça da febre amarela). Horas mais tarde, o governo anunciou mais três mortes decorrentes da doença.



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