Entrevista:O Estado inteligente

domingo, janeiro 13, 2008

Gasto com cartão é recorde na gestão Lula

Despesa foi de R$ 75,6 mi, 129% a mais do que em 2006, segundo CGU

Sônia Filgueiras

Em 2007, o governo federal mais que dobrou suas despesas com cartões corporativos. O Portal da Transparência, mantido na internet pela Controladoria-Geral da União (CGU), mostra que R$ 75,6 milhões foram gastos por intermédio dos cartões, 129% a mais do que em 2006. O desempenho do mais importante programa social do Executivo não chegou nem perto disso: a expansão dos investimentos do Bolsa-Família no ano passado foi de 14,6%. Nos últimos anos, o aumento dos gastos com cartão é crescente. Comparada a 2004, a despesa é 4,3 vezes maior.

Implantados sob o argumento de que são instrumentos ágeis, eficientes e transparentes para realização de pequenas despesas, os cartões apresentam uma espécie de buraco negro em sua prestação de contas eletrônica: a maioria dos gastos foi feita a partir de saques em dinheiro. Ao serem divulgadas nos sistemas eletrônicos e sites do governo na rede de computadores, essas retiradas não trazem as informações sobre as despesas a que se destinam. Em 2007, elas chegaram a R$ 58,7 milhões, correspondentes a 75% do total. Em 2006, elas representaram 63% do total.

Indicado para pagamentos de pequenos serviços a pessoas físicas, em estabelecimentos onde o cartão não é aceito ou para gastos em localidades remotas onde a única alternativa seja a quitação em dinheiro vivo, o saque em espécie tem sido tradicionalmente a opção mais usada pelos milhares de servidores públicos que receberam o cartão. Para verificar como o dinheiro foi gasto, é preciso pesquisar os documentos apresentados pelo servidor à repartição pública na qual trabalha.

“É um golpe nos princípios da transparência e da publicidade”, diz o deputado da oposição Duarte Nogueira (PSDB-SP), que apresentou requerimento pedindo que o TCU aumente a fiscalização dessas despesas.

Segundo o governo, ações específicas - o censo agropecuário e a contagem populacional de pequenos e médios municípios realizados pelo IBGE, ligado ao Ministério do Planejamento, e atividades de inteligência da Agência Brasileira de Inteligência (Abin), ligada à Presidência da República, antes e durante os Jogos Pan-Americanos - foram os grandes responsáveis pelo aumento no volume total e nas retiradas em dinheiro. Juntos, os dois eventos representaram gastos de R$ 40,2 milhões, que foram pagos quase integralmente em espécie.

O IBGE informa que as retiradas em dinheiro cobriram gastos de deslocamento de 80 mil pesquisadores remetidos ao interior do País. “As prestações de contas estão em um sistema interno informatizado que colocamos à disposição para a consulta de quem nos procurar”, diz o diretor-executivo, Sérgio Cortes. A Abin explica que faz saques para preservar a natureza sigilosa de suas ações.

Nesse caso, o acesso é dado em caráter reservado ao TCU, à CGU e a alguns parlamentares. Outros ministérios também registraram expansão, entre eles Educação, Saúde, Previdência e Desenvolvimento Agrário, com maiores volumes.

Só três registram redução: Comunicações, Integração Nacional e Meio Ambiente, mas o impacto, de R$ 75,6 mil, é pequeno em relação ao total.

A CGU, responsável pelo controle interno dos gastos do governo, afirma que o aumento se deve a “fenômenos sazonais” e a um processo de migração de despesas antes feitas por intermédio de um sistema antigo para o do cartão. No sistema anterior, funcionários recebiam um suprimento, depositavam-no em uma conta em seu nome no banco e emitiam cheques. Segundo o órgão, feitas as compensações e exclusões, não haveria aumento real dos gastos na maioria dos casos. A CGU informa ainda que as despesas pagas com cartões corporativos são pequenas, situando-se entre 0,002% e 0,004% dos gastos totais do Executivo.

LIMITES E CRITÉRIOS

O próprio governo admite a necessidade de restringir saques em dinheiro. A CGU informa que estuda com o Ministério do Planejamento formas de fixar limites para os saques. “Sabemos que isso não pode ser feito de forma linear, mas observando-se o perfil de cada órgão e contemplando-se as excepcionalidades”, informou a assessoria da controladoria.

Seria o caso de órgãos que operam em zonas rurais, como o IBGE em seus trabalhos de campo, o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) e a Fundação Nacional do Índio (Funai), ou são obrigados a fazer deslocamentos constantes e sigilosos, como a Polícia Federal e a Abin. “Consideramos o uso do cartão positivo. O que deve ser observado é a preferência pela compra direta mediante faturamento e a limitação dos saques em dinheiro para os casos em que isso seja inevitável”, aponta o órgão.

Para o deputado Antônio Carlos Magalhães Neto (DEM-BA), que investigou as despesas com cartões realizadas pela Presidência da República nas CPI dos Correios, além de limites, faltam critérios no uso dos cartões corporativos. “Com esse volume de gastos, o cartão está sendo usado de forma abusiva e fere a moralidade”, critica ACM Neto.

Secretaria da Presidência consumiu R$ 11,1 mil por dia

Apesar disso, Planalto conseguiu reduzir os gastos em relação a 2006

A Secretaria de Administração da Presidência da República, que administra, entre outros gastos, as despesas do gabinete do presidente Luiz Inácio Lula da Silva e da Casa Civil, consumiu, em média, R$ 11,1 mil por dia, pagos com cartões de crédito corporativos.

Segundo dados da Controladoria-Geral da União (CGU), comandada por Jorge Hage, há gastos com compras de supermercado, bebidas, carnes, ferragens, combustíveis, artigos de papelaria e serviços mecânicos. No total, foram R$ 4,054 milhões ao longo de 2007.

Há, por exemplo, dez faturas de valor superior a R$ 2 mil referentes a compras realizadas em uma das melhores casas de carne de Brasília. O funcionário do Palácio do Planalto responsável pelos gastos pagou despesas de R$ 114,9 mil no cartão ao longo do ano passado. O extrato inclui ainda compras sistemáticas realizadas quase sempre na mesma rede de supermercados brasiliense.

“São casos em que é preciso verificar se não sairia mais barato ter um contrato de fornecimento permanente, licitado, que cobrisse tais despesas”, critica o deputado Antonio Carlos Magalhães Neto (DEM-BA).

A assessoria da Casa Civil informa que o palácio mantém um contrato de fornecimento de alimentos com uma empresa selecionada em licitação pública e as compras feitas no cartão são excepcionais, realizadas apenas quando aquisições por intermédio de concorrência não foi possível.

Pelas normas da Presidência que regulamentam o uso do cartão corporativo em despesas palacianas, são permitidos gastos para “manutenção e eventos sociais nas residências oficiais do presidente da República, ressalvadas as que possam subordinar-se ao processo normal de aquisição e contratação”.

PORTAL

Ao contrário da maioria dos demais órgãos do governo federal, os gastos do Palácio do Planalto com cartão corporativo em 2007 ficaram abaixo do ano anterior, quando chegaram a R$ 4,982 milhões. Mas ainda mantêm uma característica bombardeada pelos políticos de oposição. A maioria delas é de origem sigilosa. Ou seja, é impossível verificar pelo Portal da Transparência da CGU qual foi sua destinação ou sequer o valor específico de cada despesa. Apenas o total final é registrado no portal da CGU.

A assessoria da Casa Civil informa que a redução foi produto de um pente-fino nos gastos. “Desde 2004 a Secretaria de Administração tem trabalhado para identificar as despesas passíveis de contratação e com isso pôde-se observar uma diminuição considerável dos gastos relacionados aos cartões.” Em 2004, eles somaram R$ 7,8 milhões.
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Secretária da Igualdade Racial é líder em gastos

Despesas de viagem com o cartão corporativo de Matilde atingiram R$ 171,5 mil, quase 7 vezes mais que o segundo, Altemir Gregolin

Sônia Filgueiras

Cinco integrantes do primeiro escalão do governo utilizaram os cartões corporativos para pagar despesas de viagem no ano passado. Matilde Ribeiro, secretária de especial de Políticas de Promoção da Igualdade Racial, liderou as despesas, com gastos de R$ 14,3 mil mensais em média, mais do que seu salário mensal, de R$ 10,7 mil.

Em 2007, Matilde pagou R$ 171,5 mil em despesas de viagem com o cartão corporativo. Os gastos da ministra incluíram hotéis, restaurantes e aluguéis de carros, que responderam pela fatia mais pesada da fatura: R$ 121,9 mil, sempre pagos à mesma empresa de locação de veículos. Em 2006, suas despesas no cartão somaram R$ 55,5 mil. Não foram maiores porque ela recebeu o cartão em julho.

As despesas de Matilde foram quase sete vezes mais elevadas do que as do segundo colocado da lista, o secretário especial de Aqüicultura e Pesca, Altemir Gregolin, que gastou no ano passado R$ 22,6 mil, também com despesas de viagem. O terceiro da lista é o ministro dos Esportes, Orlando Silva, com R$ 20 mil. A ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, registrou os gastos mais modestos: R$ 2,4 mil.

A assessoria de Matilde informa que no ano passado houve necessidade de intensificar a relação com os novos governos estaduais e rediscutir políticas de promoção da igualdade racial. Por isso, alega que foi obrigada a viajar mais.

Também diz que todas as suas despesas de viagem são integralmente feitas no cartão e, por não ter estrutura nos Estados, como escritórios, carros oficiais e motoristas, as despesas com deslocamentos se elevam. A secretaria usa os serviços da mesma locadora por ter “desempenho satisfatório pelo constante atendimento a autoridades, ofertando equipe qualificada em segurança e amplitude dos serviços em todo o território nacional”. Mas não há contrato permanente com a empresa.

Já Altemir Gregolin registra despesas baixas com o aluguel de automóveis porque, segundo sua assessoria, além dos quatro escritórios que a secretaria possui nos Estados com carros e motoristas, o secretário sempre pede às autoridades estaduais que visita a cessão de um carro oficial e um ajudante de ordens.

Orlando Silva viajou menos que Matilde e, nas viagens que fez, não gastou com aluguel de automóveis, mas, em alguns casos, usou o cartão para pequenas despesas de táxi. Segundo sua assessoria, o ministério preferiu contratar em concorrência pública uma empresa transportadora para atender toda a pasta, inclusive os deslocamentos do ministro quando está fora de Brasília.

O contrato prevê a cobrança de diárias, quando o carro, com motorista, é disponibilizado. Em alguns casos, Silva opta pelo táxi para economizar. Por exemplo, nos casos em que no dia seguinte à agenda sairá do hotel diretamente para o aeroporto, é mais barato pagar uma corrida de táxi do que a diária do automóvel.

No caso do ministro dos Esportes, os gastos mais elevados estão nas contas de restaurante. Durante os Jogos Pan-americanos, Orlando Silva chegou a pagar R$ 436,90 em um restaurante. Há outras duas faturas de despesas com alimentação de R$ 200 e R$ 352. “Em alguns casos, quando em cumprimento de sua agenda oficial, o ministro, acompanhado por dirigentes esportivos, autoridades federais, estaduais e municipais, tem suas despesas com alimentação pagas por aquelas autoridades. Esporadicamente, a juízo do titular desta pasta, como forma de retribuição, ocorre o inverso”, informou, por escrito, a assessoria de Orlando Silva.

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