Entrevista:O Estado inteligente

domingo, janeiro 27, 2008

AUGUSTO NUNES SETE DIAS

A menos santa das ceias

Em vez de 12 apóstolos espalhados pela mesa retangular, acomodavam-se na mesa redonda presidida pelo mestre 37 devotos, todos sem chances de canonização. O futuro dirá se, como há quase 2 mil anos, o grupo incluía dois traidores. O passado informa que ali não faltavam pecadores, alguns com mais contas a acertar com a justiça divina que Judas Iscariotes. Não seriam distribuídos pão e vinho, só sanduíches de presunto. Mas o homem de barba na cabeceira da mesa decidiu que essas diferenças eram irrelevantes. E caprichou no papel de Jesus Cristo.

As palavras de abertura avisaram que, aos olhos do presidente da República, a 16ª reunião do ministério promovida desde 2003 tinha tudo a ver com a passagem bíblica que inspirou o célebre quadro de Leonardo da Vinci. "Sentamos a esta mesa aqui, e parece a Santa Ceia: todo mundo amigo", disse Lula a seus discípulos na penúltima quarta-feira deste janeiro. Transformados subitamente em amigos de infância, todos sorriram uns para os outros. Edison Lobão e Dilma Rousseff pararam de trocar pontapés sob a mesa. Marina Silva acenou para Mangabeira Unger.

"Mas depois passamos um ano sem conversar entre nós", continuou o pregador. (A Santa Ceia de verdade foi, para Cristo, também a última. Mortos não conversam. Os sobreviventes deixaram de encontrar-se para escapar da cadeia e da forca. Pelo jeito, Lula não sabe disso). "Há quase meses e meses que vocês não trocam idéias", repreendeu Lula. Bilhetes rabiscados às pressas comprovaram que a turma captara o espírito da coisa. Num deles, Celso Amorim comunicou a Carlos Lupi que vê com simpatia a instalação de uma Casa do Trabalhador em cada embaixada.

Noutro, Guido Mantega prometeu a Geddel Vieira Lima liberar no dia seguinte aquele dinheiro que deveria ter saído no ano passado. Luís Marinho convidou Matilde Ribeiro para acompanhar a seu lado, num camarote na Sapucaí, os desfiles das escolas de samba. Nelson Jobim perguntou a Tarso Genro como é mesmo o nome do ministro da Agricultura. E ficou combinado que todos estarão juntos no Natal. Até lá, tratarão de obedecer aos mandamentos do mestre. Devem celebrar as proezas do governo. Devem controlar o Congresso. E vencer a eleição deste ano.

Nada tem de surpreendente a constatação de que o católico Lula ignore o que foi a Santa Ceia. Quem acha leitura pior que exercício em esteira sai em desabalada carreira quando vislumbra um exemplar da Bíblia. Espantosa é a descoberta de que o homem enviado pela Divina Providência para salvar o Brasil já se sente à vontade para brincar de Cristo. Não para salvar a Humanidade, mas a própria pele. Se Deus não fosse brasileiro, se não tratasse Lula com a camaradagem de compatriota, o mais tremendo dos raios teria fulminado a menos santa das ceias.

Cabôco Perguntadô

Ao saber que Edison Lobão assumiria o Ministério de Minas e Energia, o Cabôco achou que o Senado sairia no lucro. Mudou de idéia depois de confrontado com o prontuário do primeiro suplente - Lobinho, uma edição piorada do pai. Animou-se ligeiramente com a notícia de que o herdeiro se licenciaria do cargo já no dia da posse. Perdeu de vez a paciência ao verificar que a "capivara" do segundo suplente, um certo Remy, reforça a suspeita de que, no Brasil, o que parece muito ruim sempre pode piorar.

O Cabôco quer saber o que o simpático Estado tem contra o Senado. E pergunta: o que espera o Poder Judiciário para enquadrar os eleitores da trinca por formação de quadrilha ou bando?

Dilma faz de conta que fez

Para assustar oposicionistas excitados com crises políticas de bom tamanho, o presidente João Figueiredo ameaçava "chamar o Pires" - Walter Pires, o general com cara de durão que chefiava o Ministério do Exército. Para tranqüilizar brasileiros inquietos com crises administrativas (ou assombrados com epidemias de inépcia), o presidente Lula promete "chamar a Dilma" - Dilma Rousseff, a ministra com jeitão de durona que chefia o Gabinete Civil.

Como Figueiredo nunca chamou o general de poucas palavras, o país não pôde saber o que Pires faria. Como Lula vive chamando a loquaz superministra, o Brasil ouve com freqüência o que Dilma pretende fazer. Não faz. Mas faz de conta que fez.

A relação de proezas imaginárias inclui, por exemplo, o terceiro aeroporto em São Paulo, construído naquele terreno cuja localização Dilma demorou a revelar "para evitar especulações imobiliárias". A lista é engrossada pelas usinas que livraram a nação de outro apagão energética. E acaba de ser engordada pela transformação do Brasil no maior canteiro de obras do planeta.

O milagre foi operado pelo discurso de 70 minutos em que Dilma discorreu sobre o ritmo e os rumos do programa incomparável. Da noite para o dia, o que estava atrasado ficou a um passo da inauguração, concluiu-se o que parecia nem ter começado, apareceu o dinheiro que faltava. Tudo isso foi Dilma que fez.

O ministro teve uma idéia

Carlos Lupi, ministro do Trabalho e presidente do PDT, teve uma idéia: instalar em cada embaixada brasileira uma Casa do Trabalhador. Em tese, a invenção se destina a abrandar o martírio dos brasileiros distantes da pátria. "Nessas casas eles poderiam beber caipirinha e comer feijoada", argumenta Lupi. Na prática, a maluquice acabaria forjando um imenso cabide de empregos. Ali ficariam pendurados, à espera do salário pago em dólares, parentes, amigos e afilhados do pai da idéia. Se idiotia fosse crime, Lupi, que tem mais gabinetes que neurônios, estaria na cadeia. Como não não é, vai continuar no ministério, na chefia do PDT e na lista dos companheiros que deixam Lula grávido de orgulho.

Yolhesman Crisbelles

A taça da semana vai para a ministra Matilde Ribeiro, chefe da Secretaria da Integração Racial e nova recordista nacional na modalidade "gastança com cartões corporativos", pela sopa de palavras servida para explicar como conseguiu atingir, em dezembro último, a extraordinária marca de R$ 175.500.

As despesas foram geradas por motivação de agenda de trabalho em diferentes cidades e Estados e, também, pela estrutura regionalizada da Secretaria de Integração, que não dispõe de órgãos de cooperação direta, o que impossibilita apoio logístico.

Tudo explicado. Até as compras que Matilde andou fazendo na loja de um free shop.

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